Anestesia peridural e subaracnóidea

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Anestesia subaracnóidea e peridural

Texto de Clara Mota Randal Pompeu


A introdução de anestésicos no espaço peridural ou espaço subaracnóideo, levando a uma interrupção temporária da transmissão dos impulsos nervosos, representa as chamadas anestesias raquidianas. Quando bem indicada, a anestesia raquidiana promove menor perda de volume sanguíneo, diminui os eventos tromboembólicos, facilita o manejo da analgesia pós-cirúrgica, reduzindo a morbimortalidade.

Algumas contraindicações são recusa do paciente, infecção localizada no local da punção, hipovolemia não corrigida, distúrbios de coagulação, além de dificuldades técnicas. Alterações neurológicas, terapia com medicamentos que alteram a coagulação, bacteremia, assim como realização de cirurgia de coluna vertebral e história de trauma.

A coluna vertebral é formada por 33 vértebras (7 cervicais, 12 torácicas, 5 lombares, 5 sacrais e 4 coccígeas) e por 31 pares de nervos (8 cervicais, 12 torácicos, 5 lombares, 5 sacrais, 1 coccígeo). As punções raquidianas são realizadas nos espaços intervertebrais. As vértebras se articulam através de ligamentos, como o supra-espinhoso, o interespinhoso e o ligamento amarelo. O cana espinhal, que passa do forame magno até o hiato sacral, passa pelos forames vertebrais. O espaço peridural, a dura-máter, o espaço subdural (virtual), a aracnóide, espaço subaracnóide (líquido cefalorraquidiano) e pia máter (seguida por medula espinha e cauda equina, a níveis mais profundos) encontram-se em um plano mais profundo. No adulto, a medula estende-se até o nível de L2. Para realizar a punção, traça-se uma linha imaginária unindo as bordas superiores das cristas ilíacas e cruzando a coluna, a nível de L4.

Anestesia Subaracnóidea

Introduz-se anestésicos locais no espaço subaracnóideo, sendo indicada para cirurgia de membros inferiores, região perineal e abdome. São usadas agulhas classificadas de acordo com a Escala de Gauge (na qual um menor número indica um maior diâmetro). Quanto maior o diâmetro da agulha, maior o risco de complicações, com cefaléia. Há diferentes formas de bisel também, como cortante, ponta de lápis e ponta arredondada.

Durante a punção, a agulha atravessa pele, subcutâneo, ligamento supraespinhoso, ligamento interespinhoso, ligamento amarelo (vence a resistência), dura-máter e aracnóide. Observa-se, então, gotejamento de líquor claro pela agulha. Após deposição do anestésico, grande parte deste é absorvida pela rede vascular nos primeiros cinco minutos. A partir de então, sua concentração diminui em uma velocidade menor, uma vez que os anestésicos não são metabolizados no líquor. Através de bloqueio reversível da condução nervosa, ocorre, então, analgesia (fibras C sensitivas) e bloqueio motor e simpático (fibras B pré-ganglionares).

Em anestesias subaracnóideas, deve-se estar atento a baricidade da solução utilizada. Anestésicos hipobáricos tendem a ascender pelo canal medual, quando o paciente em posição sentada, enquanto soluções hiperbáricas tendem a descer. Altas doses de anestésicos podem levar a complicações neurológicas, assim como altas concentrações, que podem incorrer em desmielinização e síndrome da cauda equina. O bisel deve ser introduzido paralelamente às fibras, que correm longitudinalmente, e depois ser orientado cefalicamente.

Podem ser observados alguns efeitos sistêmicos, como uma vasodilatação, diminuição da pressão arterial e diminuição da frequência cardíaca, a nível cardiovascular. Como o diafragma é inervado pelo nervo frênico (origem de C3 a C5), há poucas repercussões em relação ao sistema respiratório. Porém, deve-se ficar atento a pacientes com DPOC e asma, uma vez que um quadro de insuficiência respiratória pode ser desencadeado por bloqueio torácico.

Quanto ao sistema digestivo, uma vez que sua inervação simpática tem origem de T6 a L2, com o bloqueio, há predomínio parassimpático, aumentando, pois, o peristaltismo, as secreções digestivas e melhorando a perfusão intestinal. Havendo um bloqueio a nível de S2 a S4, parassimpático, portanto, pode ser observada retenção urinária, decorrente de atonia vesical e de aumento do tônus esfincteriano. A nível endócrino, há uma diminuição da resposta metabólica, traduzida em menor liberação de catecolaminas, cortisol e insulina.

Algumas possíveis complicações são hipotensão arterial sistêmica, cefaléia pós-punção e lombalgia. A hipotensão pode ser corrigida com reposição com cristalóides e utilização de vasopressores. Essa hipotensão pode levar a uma hipoperfusão tecidual, o que implica a necessidade de aumento na fração inspirada de O2. Pode ocorrer também uma meningite por contaminação, lesões neurológicas e síndrome da cauda equina.

Anestesia Peridural

Própria para cirurgia de membros inferiores, região perineal, abdome e tórax. A posição mais confortável para o paciente é em decúbito lateral, em flexão forçada, podendo também ser feita com o paciente sentado, aumentando, contudo, o risco de lipotímia. A punção pode ser realizada tanto a nível torácico (sendo preferível C7-T1 e T1-T2) quanto lombar.

Penetra-se a agulha por via mediana ou paramediana, em um ângulo de 90 graus, até encontrar a resistência do ligamento amarelo. Quando se vence essa resistência (Técnica de Dogliotti), atinge-se o espaço peridural. A técnica de Gutierrez também permite a identificação do espaço peridural, através da colocação de uma gota de solução fisiológica no canhão da agulha, que é aspirada devido a pressão negativa do espaço peridural. É possível colocar-se um cateter no espaço peridural, para que se possa prolongar a anestesia/analgesia em procedimentos como parto e de longa duração.

Como os anestésicos não são aplicados em contato direto com a medula espinhal, há necessidade de uma maior quantidade de solução, além do que, a ação absortiva dos vasos do espaço peridural acaba diminuindo a ação do anestésico e aumentando os efeitos sistêmicos. Quando aplicado, o anestésico sofre dispersão em direção cefálica, caudal e transversal, esta última dependendo da permeabilidade dos orifícios pelos quais passam os nervos raquidianos que saem do canal vertebral. Há uma relação direta dose-efeito, logo a concentração e o volume de anestésicos estão diretamente relacionadas ao número de metâmeros bloqueados.

Devido ao bloqueio simpático, pode haver queda do retorno venoso, do débito cardíaco e da pressão arterial. Quando há punção acidental da dura-máter, pode haver cefaléia. Ocorrendo punção dural, com injeção indevida de anestésico previsto para um procedimento peridural, realiza-se uma raque total, induzindo um quadro de depressão respiratória, colapso cardiovascular, alteração do nível de consciência e depressão do tronco encefálico. Quando se realiza uma peridural total, ou seja, há difusão total do anestésico até região cervical, sem, porém, haver depressão central, uma vez que não há penetração do anestésico nessa região, instala-se um quadro de bloqueio sensitivo e motor de membros superiores e do pescoço, associado a hipotensão arterial e depressão respiratória. Caso o paciente possua algum tipo de distúrbio de coagulação, pode haver formação de um hematoma peridural.

Em um caso em que, seja por injeção intravascular acidental ou por absorção de doses elevadas, haja uma intoxicação do sistema nervoso central, a apresentação envolve gosto metálico, zumbido, tontura, dislalia, sonolência, tremores, podendo evoluir para convulsões, insuficiência respiratória e parada cardíaca.


Bibliografia

- Fundamentos da Anestesiologia e da Cirurgia Ambulatorial

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